A Prescrição de Marcola: O Veredito Não É Sobre o PCC, Mas Sobre a Falência do Estado

A recente decisão da Justiça de São Paulo de extinguir a punibilidade da maior ação penal já proposta contra o Primeiro Comando da Capital (PCC), envolvendo mais de 160 réus, incluindo o líder Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, não é apenas um revés processual. É um monumento à falência sistêmica e um atestado de incapacidade do Estado em combater o crime organizado em sua própria arena: o Judiciário.

Apesar da defesa dos réus celebrar o desfecho como uma garantia legal constitucional – o direito à segurança jurídica contra o poder punitivo eterno do Estado – a verdade por trás desta prescrição é sombria. O processo, iniciado com a grandiosa denúncia do Ministério Público em 2013, demorou 12 anos para morrer na morosidade burocrática, sem sequer chegar a um julgamento de mérito.
12 Anos de Inação
O crime em questão, associação criminosa, previa penas que impõem um prazo prescricional que a Justiça falhou em respeitar. A conclusão é simples e devastadora: o Estado perdeu o prazo. A complexidade e a dimensão do caso — que envolvia escutas telefônicas, delações e centenas de páginas de provas contra a cúpula de uma das maiores facções criminosas do mundo — serviram de desculpa, mas não de justificativa, para a inação.
Como bem apontou a Desembargadora Ivana David, do TJ-SP, a extinção deste processo é uma “falha do Estado”. Ela resume o sentimento de frustração de grande parte do aparato de segurança pública e da sociedade: o esforço de anos de investigação da Polícia e do Ministério Público foi anulado pela ineficiência da máquina judicial.
A Lição Amarga
É crucial sublinhar que a liberdade de Marcola e dos principais líderes da facção não está em risco. Eles permanecem presos e cumprindo longas penas acumuladas em outros processos. No entanto, o dano simbólico desta prescrição é incalculável.
O PCC, enquanto organização, opera com agilidade e coordenação paramilitar. Ao mesmo tempo, o Judiciário, que deveria ser o pilar da resposta estatal, age com a lentidão de um paquiderme.

Se o Estado brasileiro é incapaz de dar celeridade a um processo de tamanha relevância e repercussão, que tipo de mensagem está sendo enviada às células menores do crime organizado? O recado é de impunidade processual: o tempo é um aliado do criminoso e um inimigo da Justiça.
Esta falha não se resolve com mais leis penais, mas com a modernização urgente dos tribunais, a digitalização eficaz dos processos complexos e a alocação de recursos humanos e tecnológicos suficientes para que a resposta do Estado seja proporcional à ameaça representada pelo crime organizado.
A prescrição de Marcola é o veredito do sistema: o PCC é uma ameaça, mas a burocracia judicial pode ser a maior aliada da impunidade no Brasil.
